13 de maio de 2024, 8h00
A Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo abrigou o seminário Um Futuro Mais Sustentável, organizado pela professora Patrícia Iglécias, com o patrocínio da Superintendência de Gestão Ambiental da USP e do Instituto Atmos. Por generosidade dos organizadores fui convidado para tratar de financiamento para preservação do meio ambiente.
O tema é relevantíssimo, e busquei dar alguma sistematicidade à multiplicidade de possibilidades existentes nos 10 minutos concedidos a cada expositor.
Constata-se existir um âmbito regulatório tributário, com normas indutivas, que visam dar algum direcionamento à matéria. Algumas se encontram na recente EC 132, que modificou o sistema de tributação do consumo no Brasil. Foi formalizado como um princípio de Direito Tributário a proteção ao meio ambiente, o que dará novo direcionamento à matéria.
No PLP 68 foi incluído que a reciclagem dará direito ao crédito do IBS+CBS quando os produtos forem adquiridos de cooperativas e o adquirente estiver no Simples. Nele também foram estabelecidos os contornos do Imposto Seletivo, incidente sobre veículos poluentes — embora pense que o ideal seria fazer incidir sobre o combustível e não sobre o veículo. Existem outros aspectos importantes sobre matéria tributária e ambiental nesse PLP que merecem análise mais detida.
Existe um âmbito propriamente financeiro, relativo a fundos dirigidos à proteção do meio ambiente. Esses podem ser alimentados por doações de governos estrangeiros, como o Fundo Amazônia, ou podem ser mistos, entre governos e empresas. O que dará o caráter ecológico é a destinação normativa do uso dos recursos arrecadados. Um exemplo é o Fundo de Defesa de Interesses Difusos, gerido pelo governo federal, pois seus recursos não estão vinculados exclusivamente à proteção ecológica, mas também servem à essa finalidade.
Outra forma de financiamento ambiental se verifica por meio do mercado de créditos de carbono, que deve ser regulamentado pelo Congresso Nacional criando o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Trata-se de medida importante, mas não suficiente para solucionar os problemas existentes.
Deve-se ter especial atenção com a apuração desses créditos, a fim de identificar a assimetria dos biomas, pois alguns gerarão mais créditos que outros, além de ser necessária muita atenção para a distinção entre a valoração da floresta em pé versus o reflorestamento — parece óbvio que manter a floresta deve gerar mais créditos que reflorestar, a depender do bioma sob análise.
Outro capítulo sobre financiamento da proteção ambiental passa pelo sistema bancário, público, privado, internacional ou multilateral. É imprescindível que haja regulação estatal sobre essa matéria, não apenas direcionando recursos para essas finalidades por meio de normas indutivas, mas também proibindo o financiamento de atividades prejudiciais ao meio ambiente por meio de normas diretivas. Não basta que alguns bancos adotem procedimentos internos nesse sentido. É necessário haver regulação que vincule todo o sistema financeiro nacional.
Existe também uma forma de participação acionária pública em empreendimentos privados, com aporte de capital, que foi muito utilizada no passado no âmbito da Sudam e da Sudene, que previa a emissão de ações das empresas incentivadas, fazendo com que o governo federal se tornasse acionista desses empreendimentos.
A legislação precisa ser aperfeiçoada, mas é uma alternativa que não deve ser descartada. No passado, havia previsão de liberação de recursos por parte da Sudam caso as empresas comprovassem que haviam destocado a área para fazer pasto — parece inacreditável aos olhos atuais, mas funcionava dessa forma; eu vi.
Outra forma de financiamento é por meio de filantropia, que pode ocorrer por diversos meios. Também aqui há necessidade de aperfeiçoamento da legislação brasileira. A lei dos endowments (Lei 13.800/19), por exemplo, teve vetos que impedem a concessão de benefícios fiscais aos doadores, o que esvazia seu alcance. É necessário olhar os exemplos estrangeiros nesse campo e adaptá-los à nossa realidade, visando incrementar esses mecanismos filantrópicos em nosso país.
Todos esses mecanismos financeiros, dentre outros possíveis, permitirão reduzir o impacto ambiental. Precisam ser aperfeiçoados, mas são formas de atuação do Estado regulando a matéria. Insuficientes para solucionar o problema, mas auxiliarão.
Na verdade, a eficácia passa pela redução do consumismo por parte da sociedade e a modificação do sistema de obsolescência programada dos bens por parte das empresas. Alterar esses dois aspectos reduziria a escalada de degradação ambiental do planeta. O Brasil deve contribuir com o esforço planetário nesse sentido, em busca de sustentabilidade.
Devemos aprender com o lastimável estado de emergência ambiental em que se encontra o estado do Rio Grande do Sul, com milhares de vítimas fatais e desabrigados, necessitando de muita ajuda humanitária e acolhimento.
Os governos brasileiros e de diversos países, em conjunto com organizações nacionais e internacionais, e milhares de voluntários, estão prestando o socorro possível no meio desse desastre ecológico. Isso demonstra que os instrumentos financeiros são uma forma de viabilizar o necessário socorro às vítimas e à economia, mas o ser humano deve sempre estar em primeiro lugar nas preocupações econômicas, financeiras e ambientais.
Sem o ser humano, não existe economia, nem ecologia, e muito menos finanças.
FONTE: https://www.conjur.com.br/2024-mai-13/notas-sobre-o-financiamento-da-preservacao-do-meio-ambiente/